Sobre o trabalho (2018)
O desenho me interessa por ser
primordial (disponível, como a fala, desde a primeira infância); transparente (independente
de segredos técnicos e ferramentais específicos); ficcional (justapondo espaços
e tempos diversos, somando grandezas de diferentes naturezas); transcendente (significando
passagem/presença/ação); relacional (ferramenta de contato, partilha e
construção de campo comum).
Embora eu desenhe desde a adolescência,
frequentando aulas em ateliês de artistas e, mais tarde, ao longo da graduação
em Arquitetura e Urbanismo, foi durante o período em que vivi entre Paris e
Berlim (1994-2001) que se delinearam os interesses centrais que me norteiam. Nos
últimos 20 anos o desenho permeia meu trabalho como modo operatório, presente
em práticas e materialidades diversas: obras sobre papel, desenhos digitais,
animações, vídeos, performances, instalações.
Os diversos grupos de obras se
conectam pela ideia de acúmulo e de recobrimento, funcionando em sistema,
interdependentes e heterogêneos.
Radicada novamente no Brasil desde
2001, tenho dividido meu tempo entre prática de ateliê e atividade docente, em
instituições de ensino fundamental e superior, assim como em cursos livres e
oficinas. Em 2005 fundei, juntamente com Paulo Camillo Penna, a Casateliê,
espaço de produção, ensino e venda de arte localizado no centro da cidade de
São Paulo.
A ‘Coleção de medições” começou a
se formar em 1999. Neste conjunto de trabalhos, fragmentos de espaços, objetos,
lugares, mapas e plantas arquitetônicas, reunidos ao longo dos anos, são
notados por meio de mensuração direta ou indireta, frotagem, fotografia ou
croqui. O conjunto de notações constitui um banco de dados a partir do qual são
produzidos instalações, desenhos sobre o chão, imagens digitais e animações que
recombinam os elementos da coleção, em geral reproduzidos em escala.
Nas ‘Estruturas’, produzidas
desde 2005, parto da observação de objetos naturais: formigueiros, folhas,
brotos, organismos microscópicos. A observação é a base para desenhos
sucessivos que buscam a compreensão de seu funcionamento, do modo como crescem
ou se acumulam. Num conjunto iniciado em 2014, observo particularmente
estruturas pulsantes como as de medusas, raias, águas‐vivas ou células cardíacas
e seus movimentos que respondem à mecânica dos fluídos, resistentes e
flexíveis.
As performances e vídeos surgem
como desenvolvimento do aspecto relacional do desenhar. Os ‘Walkfields’ e
‘Urban Drawings’, desenvolvidos entre 2000 e 2001, experimentam a relação entre
corpo e medidas objetivas de um espaço. A instalação ‘9 quartos’ (2011) gerou
uma animação digital (‘9 quartos em ciclo’) que explorou a relação entre minha
memória dos espaços e a duração de minha vida.
A ação implicada no desenhar das
‘Estruturas’ está na origem das séries de vídeos ‘Formações’ (2011), ‘Desenhos
de memória’ e ‘Tábula rasa’ (2013). Nestas duas últimas séries, desenhar e
apagar, com giz ou sobre uma base de plastilina, problematiza o fazer e o
pensar a forma e sua prevalência sobre a existência do objeto perene. ‘Ping
Pong’, série de performances elaboradas em conjunto com Suiá Ferlauto em 2013,
reflete sobre as possibilidades do desenho como ferramenta de
contato/construção conjunta.
Adalgisa Campos
2018